Cada novo amigo é um pedaço reconquistado de nós mesmos. - Friedrich Hebbel

As Palavras são entidades mágicas, potências feiticeiras, poderes bruxos que despertam os mundos que jazem dentro dos nossos corpos, num estado de hibernação, como sonhos. - Rubem Alves

Não há nada de nobre em sermos superiores ao próximo. A verdadeira nobreza consiste em sermos superiores ao que éramos antes. - Esopo

Quem olha para fora, sonha. Quem olha para dentro, acorda. - Carl Jung

É mais fácil escrever dez compêndios de filosofia do que aplicar um só princípio na prática. - Leo Tolstoi

domingo, 18 de dezembro de 2011

Artigo: Nada ocorre por acaso

Partilho convosco um artigo publicado em 2009 na Revista Bem Estar do Diário da Região, gentilmente cedida por Lázaro Freire, o seu autor. Vela a pena a leitura e reflexão!

«Para assumir o controle da própria vida e obter o que deseja por meio da força do pensamento ou da lei da atração, por exemplo, não basta desejar. É preciso mentalizar a realização do que quer com respeito a três níveis da vida: o individual, o coletivo e o divino. Ainda assim ocorrerão fatos que, independentemente da sua vontade, irão mudar o caminho inicialmente traçado. Não tem jeito. Observe. Aliás, é a observação aos pequenos sinais emitidos no decorrer do caminho que pode fazer grande diferença no resultado do que almeja a si. Para explicar melhor como funciona esse processo o psicanalista transpessoal Lázaro Luiz Trindade Freire, que também é terapeuta junguiano e palestrante espiritualista, concedeu entrevista à Bem-Estar. Confira.



Bem-Estar - Muito se diz que nada acontece por acaso, que nada é aleatório no mundo. Na sua opinião, até que ponto as pessoas devem confiar no ‘acaso’?  
Lázaro Luiz Trindade Freire - Em minha opinião, temos aí duas coisas distintas. Uma é observar que há uma interdependência das coisas e que a realidade é muito mais do que aquilo que conhecemos. Outra é a generalização que poderia levar a uma confiança no “acaso” que nos isentaria das ações e consequências.

Em minha prática clínica observo que indiscutivelmente há uma natureza simbólica na realidade que se manifesta por meio de coincidências significativas, também conhecidas como sincronicidades, e que também se reflete nos sonhos. Prestar atenção a estes sinais e simbolismos é importantíssimo, mas isso não é um convite a viver de modo aleatório. Muito pelo contrário, entendo que os simbolismos e sinais frequentemente nos pedem uma atitude reparadora, como um convite a retomarmos a direção de nossas vidas.

Como em tudo, é necessário discernimento e bom senso. Ignorar a vida subjetiva e simbólica é um equívoco, é viver apenas na superfície, perdendo a possibilidade das realizações de nossos potenciais. Basta ler algumas biografias - não por acaso, um de meus gêneros favoritos - para perceber que todos os grandes homens souberam acreditar em seus sonhos e ler muito bem os sinais que a vida invariavelmente lhes deu.

Mas por outro lado, sincronicidades são coincidências significativas, e não qualquer fato aleatório. Há quem pense que até a placa do carro a sua frente é um recado especial de Deus apenas para ele. Menos. Muitas coisas são de fato espirituais, mas a característica principal de nossa vida se dá aqui, no material e no consciente. Pensar que tudo à nossa volta está tentando nos dar recados e ocorre em torno de nossa existência já fica mais próximo de um delírio autorreferente, uma característica de psicose. Podemos muito, mas não podemos tudo, e reside aí um equívoco frequente em co-criação por pensamento positivo e/ou leitura de sincronicidades.

Bem-Estar - O autor do livro “Tornar-se como Deus”, Michael Berg, diz que para ir de um ponto A até um ponto B é preciso ter algum plano de como chegar lá, pois assim é possível ter uma visão da melhor linha de ação. Mas quando algo ocorre nesse percurso traçado, quando a ‘vida’ interfere de algum modo nesse caminho, geralmente, há frustrações. Como lidar com isso? Acredita que as pessoas simplesmente devem acreditar que o fato ocorrido não foi por acaso ou analisar que o fato pode ter sido consequência das próprias atitudes do envolvido?  
Freire - Michael Berg baseia-se nos conhecimentos da cabala, que há muito tempo estuda essas possibilidades simbólicas e de programação existencial. Concordo que o planejamento é essencial quando pretendemos assumir o papel de cocriadores de nossas realidades. Muitas frustrações vem exatamente daí, de desejos que não levam em consideração o contexto, as consequências, os prazos, nem mesmo a exequibilidade (que pode ser feito) daquilo que desejamos pedir a Deus.

Não podemos nos esquecer que o mundo não gira ao nosso redor, e que somos cocriadores, ou seja, que todos os demais são tão deuses quanto nós. É preciso que nossas criações respeitem a “ecologia” do mundo em que vivemos, uma vez que este também foi uma criação feita a partir de nossos pensamentos anteriores.

Por exemplo, conheço pessoas que tentam mentalizar que o marido lhe dê mais segurança, ou que o pai lhe dê um carro. É um equívoco, pois as ações deveriam ser iniciadas e controladas pelo próprio sujeito. Outros pecam por falta de senso de realidade. Querem um apartamento e focam em um gigantesco no Morumbi, quando na verdade ainda moram numa casa de fundos em um bairro diametralmente oposto.

Nosso "subconsciente" (não gosto dessa palavra, mas a uso aqui por fins didáticos) descarta imediatamente a idéia. Ora, se em tese tudo nos é possível, não podemos nos esquecer que foram elas mesmas que cocriaram suas vidas nas condições atuais. Talvez fosse mais sensato planejar primeiro um apartamento decente dentro de seu padrão, e a partir dali pensar em novas realizações. Há também quem planeje coisas para as quais não tem o menor preparo e qualificação, e seria mais prudente subdividir os desejos e objetivos nas etapas anteriores. Outro exemplo, se quero ocupar um cargo que me exige determinada formação, um planejamento adequado deveria desejar esses pré-requisitos primeiro.

O equívoco mais comum nos que se revelam frustrados na cocriação de sua realidade é terem projetado apenas o ponto final, sem avaliar o impacto em sua vida e nas pessoas com quem vivem, ou sua falta de preparo para arcar com as consequências e responsabilidades da realização de seus desejos.

A esse respeito, há um ditado antigo que diz “cuidado com o que você acabou de pedir, pode ser que anjo escute”. Afinal, não há desejo que não traga consigo uma responsabilidade, a qual nem sempre quem busca atalhos quer assumir. Outra questão que ensino em meus cursos é que há três níveis de “criação”.

Bem-Estar - Que níveis são esses? Como funcionam ou atuam?

Freire - 
São os três níveis de “criação”: individualcoletivo e divino. O que podemos construir não é pouco, mas é preciso estarmos sintonizados com todos os outros potenciais criadores em ação no mesmo mundo. Para termos sucesso, aquilo que pretendemos precisa respeitar a nossa vida, os desejos dos outros, a criação coletiva que fazemos enquanto sociedade, e também o plano maior.

Costumo comparar com uma criança que faz um castelo na areia. Ela pode fazê-lo do nada, por sua vontade, mas se não considerar os limites de quem está do lado, terá sua ação limitada. Há ainda a criação coletiva. Se o castelo for deixado no meio de um campo de futebol, o interesse da coletividade - jogar bola, por exemplo - fará com que a vontade da criança seja desfeita. E há ainda as leis maiores. Se a criança faz seu castelo na região em que a maré começa a encher, o oceano o destruirá.

Com nossas criações, ocorrem coisas similares. Muitas vezes escolhemos e construímos de modo razoavelmente correto, mas contra a maré. Os planos do coletivo ou as leis divinas não vão parar apenas porque fizemos uma mentalização. Para quem planeja assumir o controle da sua vida, recomendo sempre que mentalizem sua realização de modo a respeitar o individual, o coletivo e o divino.

E por fim, é preciso nos conhecermos melhor, para que façamos nossas escolhas com consciência. Espiritualidade e psicoterapia podem ser uma ajuda valiosa nesse processo. Afinal, nem sempre nossos primeiros desejos são realmente o melhor para nossa existência. Há um ditado árabe que diz que às vezes, quando tudo dá “errado”, acontecem coisas maravilhosas que jamais seriam possíveis se tudo tivesse “dado certo”.

Bem-Estar - Os acontecimentos aleatórios seriam algum tipo de alerta emitido por Deus? Como a pessoa deve avaliar a trajetória inicial junto aos percalços do meio do caminho? Como saber se o “correto” é continuar ou parar com determinada ação ou atitude?  
Freire - Os acontecimentos aleatórios, não creio. Somos também cocriadores e o mundo tem suas próprias leis. Já as sincronicidades, coincidências particularmente significativas, sinais, estes sim muitas vezes parecem provir de alguma instância maior, que nos transcende e da qual não temos plena consciência. Para não precisarmos entrar nas opções religiosas de cada um, costumamos chamar essa estrutura de “inconsciente”. Este termo, comum da psicologia junguiana, não exclui a participação divina, muito pelo contrário. Mas também não podemos generalizar. Há muito mais coisas entre o céu e a terra do que supõe a nossa filosofia. Em outras palavras, aquilo que chamamos de inconsciente e que provoca nossos sonhos e sincronicidades recebe a ação de vários fatores, começando pelo nosso próprio psiquismo. Mas das dimensões divinas, também.

Quanto a saber o que é o melhor para a sua própria vida e fazer as escolhas mais apropriadas, creio que isso nunca tenhamos receita absoluta e é exatamente esse o desafio de viver. Atendendo em psicanálise transpessoal, noto que as pessoas de mais idade se arrependem muito mais daquilo que não fizeram na vida do que de qualquer atitude certa ou errada que um dia tenham tomado. Parece que estamos aqui justamente para fazer essas escolhas.

Quanto a mim, optei pelo caminho do autoconhecimento. Há tempos abdiquei de ser mais um religioso ou mestre espiritual, preferindo ser psicoterapeuta, filósofo, palestrante e escritor - ou seja, também lidando com as dimensões transcendentais da vida, porém com mais enfoque nas perguntas que levam à reflexão do que nas "respostas" e "certezas" que tantos pensam ter.

Essa minha própria escolha de vida responde, em parte, o que penso sobre esta pergunta do “caminho correto”. Nunca faltarão mestres, gurus e escritores de autoajuda com novas receitas mágicas sobre o “correto”, mas a própria diversidade dessas receitas "únicas" lança suspeitas sobre sua abrangência.

Penso que o caminho é possível, mas começa com um esforço sincero de autoconhecimento, de enxergar os próprios defeitos, mudar atitudes, perceber sinais, compreender os padrões da própria existência, anotar e interpretar os sonhos - enfim, aumentar a integração entre o consciente e o inconsciente, o material e o espiritual, um processo que o psiquiatra e fundador da escola analítica de psicologia, Carl Jung, chamava de “individuação”, exatamente porque só a partir desse ponto podemos nos perceber como indivíduos plenos. A partir deste autoconhecimento podemos e devemos prestar mais atenção nos sinais e padrões. Quanto mais os seguimos, mais eles se multiplicam, a ponto de dar confirmações e nos orientar no sentido da autorrealização: Os deuses das coincidências prestam muita atenção a quem presta atenção n'Eles.

Bem-Estar - Como lidar com a dualidade em confiar em Deus, ter fé de que Ele nos ‘dá’ o melhor, com o seguir com os próprios objetivos e planos?  
Freire - Não vejo dualidade nessa questão. A fé e a confiança em Deus, bem como a consciência de habitarmos um mundo de cocriação coletiva, não faz de nós menos responsáveis pelas nossas atitudes e caminhos. Em outros termos, a fé não é um convite à inércia e passividade. Deus nos orienta, o que é muito diferente de carregar no colo. A sabedoria popular nos diz que “Deus ajuda a quem cedo madruga”, ou seja, ele se faz mais presente à medida em que fazemos a nossa parte. A espiritualidade pode nos ajudar a lidarmos melhor com nossos problemas, mas não irá resolvê-los por nós. Ainda bem.


Bem-Estar - O que muda no comportamento de uma pessoa quando ela passa por um momento de tristeza profundo, diante de perdas ou grandes frustrações? Nesse período, qual a importância de confiar ou não em Deus, ou em algo superior?  
Freire - Confiar em algo superior é fundamental e podemos dizer que é uma característica intuitiva inata do ser humano e não apenas um traço cultural. Afinal, em todas as épocas, regiões e culturas o homem sempre manifestou alguma forma de culto transcendente, naturalmente, mesmo em povos que estavam isolados de outras civilizações. Portanto, há uma inversão de valores, pois traço cultural isolado é o nosso tempo não dar a Deus - ou ao inconsciente e transcendente, se preferir - a sua devida importância.

Em momentos de perdas, viver o “luto psíquico” é necessário, desde que não constitua depressão patológica. Isso sugere maior interiorização, um aprendizado com a tristeza, como se buscássemos no mais profundo de nosso interior as forças para continuar seguindo em frente. Não é por acaso, uma vez que é nesse processo - bastante subjetivo - que muitas vezes prestamos mais atenção aos sonhos, buscamos um sentido maior para a vida e reforçamos os nossos fundamentos espirituais, independente de nossa fé.

Quanto às frustrações, penso que é preciso distingui-las das grandes perdas. Elas em geral são duras, mas positivas, pois nos conscientizam de nossas expectativas irreais. Só pode se frustrar aquele que esperava de algo ou alguém, aquilo que este algo não podia lhe dar. Desilusão é sair de uma ilusão, e por mais que isso doa, não deixa de ser algo maravilhoso para a nossa evolução. E se é um momento de dor e evolução, nada melhor do que nos ancorarmos em Deus.

Bem-Estar - Qual o melhor meio de lidar com as dúvidas, incertezas e inseguranças diante do futuro, ainda que se parta do princípio que nada acontece por acaso?  
Freire - Costumo dizer aos meus pacientes que a depressão é a doença do passado e a ansiedade é a doença do futuro. Só se vive no aqui-agora e qualquer espiritualidade que tenhamos precisa ser exercida no cotidiano, aqui mesmo, nesse plano e momento, com as pessoas com quem convivemos.
Ainda bem que temos incertezas em relação ao futuro. Isso significa que ainda temos escolhas a fazer, o que em outras palavras implica estarmos vivos. Se temos dois caminhos, isso implica, naturalmente, dúvidas, e aí sim pode ser importante prestarmos atenção aos sinais, e compreendermos os significados simbólicos de nossas escolhas.

Mas se as incertezas são a única "certeza" que temos, e as dúvidas naturais, isso não significa que precisemos ter insegurança. O verdadeiro "segredo", a meu ver, é ser capaz de viver o presente e escolhermos nossos caminhos naturalmente, com o maior grau de consciência que nos for possível para aquele momento. Consequências sempre existirão, mas todo caminho trará sua recompensa.

Se, por outro lado, ficamos apreensivos com o futuro, a ponto de ficarmos inseguros, significa novamente que estamos vivendo mais o futuro do que o presente. Isso é ansiedade. Mas você poderia me dizer que, ao chegarmos ao futuro, poderemos olhar para trás e nos arrepender de nossas escolhas, mas neste caso novamente estaríamos vivendo o passado, e isso é depressão.

Não me arrependo das escolhas que fiz há 10 anos, mas não faria novamente algumas delas se tivesse a consciência que tenho hoje. Não há nada de errado nisso, pois era feliz naquele tempo com aquelas escolhas e o ser diferente que sou hoje também é fruto delas. Só se vive no presente, e na maioria das vezes, o caminho é muito mais importante do que o destino.

Bem-Estar - Qual a relação entre fé; livre-arbítrio e a lei da ação e reação? Por que a maioria das pessoas não tem consciência da ligação entre esses pontos?  
Freire - Antes de mais nada, ação e reação é uma lei natural, como a gravidade e independe de nossa consciência. O mundo simplesmente é assim, independentemente de levarmos mais ou menos tempo para perceber. Quem joga uma pedra para cima sabe que ela cairá logo depois, e aquele que semeia o mal, mais cedo ou mais tarde colhe as consequências. Não vejo castigo divino nisso, é apenas "natureza", assim como a chuva ou o sol. Se sei para onde a correnteza corre, posso nadar melhor e evitar riscos desnecessários.

Quanto ao livre-arbítrio, como disse, está sempre presente em nossas escolhas, embora eu pense que ele também é limitado às criações pessoais, coletivas e divinas. Não tenho liberdade total, mas tenho bastante. Não posso sair voando pela janela, não tenho como comprar determinadas coisas e as leis e a ética também colocam limites nas minhas atitudes. Mas tenho poder de escolha, tenho liberdade de pensamento, e tenho ainda assim infinitas possibilidades de realização.

Quanto à fé, pode se dar em dois níveis: o da simples crença, que é importante, e o da experiência interior, da certeza da presença divina, que é completamente diferente de simplesmente “acreditar” racionalmente em algo maior. Eu diria que, partindo da fé, observando os sinais, exercendo nosso livre-arbítrio consciente de suas potencialidades e limitações e sendo responsáveis com nossas ações e suas reações, podemos construir o nosso caminho de autorrealização, que via de regra costuma conduzir a uma experiência direta e intransferível de Deus.


Bem-Estar - Os eventos não premeditados sempre têm um porquê de ocorrer? É possível aprender sem se condenar, sem se estressar nem se cobrar demais?

Freire - Creio pessoalmente que a realidade seja um grande laboratório de criação coletiva. Nesse caso, em algum grau eu concordo que tudo tem o seu porque, e até mesmo que tudo seja "natural", embora a maioria das coisas seja de uma "natureza" que nos escapa à compreensão. E está exatamente nisso o segredo de não nos estressarmos ou nos cobrarmos demais, afinal, não somos oniscientes e onipresentes, e não precisamos “compreender” o motivo de tudo aquilo que nos acontece. As camadas seriam infinitas e as relações incomensuráveis.

Uma pessoa que nos detém e pergunta as horas afeta se encontraremos ou não uma pessoa mais tarde, e não há nada demais em admitirmos nossas limitações mentais e simplesmente vivermos o presente, no aqui e agora, assumindo apenas a nossa responsabilidade por nossas escolhas, e as fazendo dentro dos princípios da ética e da evolução. Não é pouca coisa, e a colheita se dará de acordo com o que plantarmos.

Estresse é uma variação da ansiedade, autocobrança é variação da culpa que nos leva à depressão, e, como disse, essas são doenças de quem vive o futuro ou o passado, respectivamente. Planejar o futuro e ser responsável com o passado é uma coisa, deixar de viver o presente é outra bastante diferente. 

Bem-Estar - Como lidar com as estatísticas e fatos do dia a dia, principalmente diante de tanta violência e ainda considerar que todos os ‘males’ não estão ocorrendo por acaso?  
Freire - Bem, a violência também não ocorre por acaso, ela é fruto da vontade de alguém, e também é reflexo de todo um contexto social. Além disso, há a questão da causa e consequência. Reclamamos da má qualidade da produção cultural, mas compramos discos piratas, que muitas vezes alimentam também a indústria do crime e da contravenção. Queremos empregos, mas preferimos comprar um contrabando de qualidade duvidosa. Muitos de nós temos violentos preconceitos com raças, povos e classes sociais, e estranhamos quando sofremos alguma outra forma de violência ou discriminação. Muitas mulheres que condenam a prostituição às vezes mantêm-se em casamentos insatisfatórios e sem amor apenas para manter determinado padrão para si ou para seus filhos. O jovem que pede paz em passeatas às vezes é o mesmo que fuma um “baseado” que financia o narcotráfico. Quem compra peças de desmanches “paralelos” para seu carro muitas vezes faz disparar mais uma encomenda de roubo de veículo similar para repor o estoque - por ironia, pode ser que o seu próprio é que seja roubado, mas se for o do vizinho, "tudo bem".

Além do mais, a vida nos trata como a tratamos. Não importam tanto os exemplos, e sim as regras. Se quando vejo um veículo prestes a estacionar no supermercado eu me aproveito de sua indecisão e entro com meu carro na vaga que seria do outro, acabei de assinar um contrato com a vida dizendo que, no mundo que eu estou cocriando, vale alguém se aproveitar do descuido do outro para tomar vantagem daquilo que o outro não vê. Aí se na semana seguinte um colega de trabalho roubar uma idéia nossa, ou usar um artifício de autopromoção que acarrete a minha demissão, não vale eu chorar reclamando para Deus que foi injusto, que tenho três filhos para criar ou algo assim. Provavelmente, mal irei me lembrar que este “movimento” de peças no tabuleiro da vida fui eu mesmo quem validei, no estacionamento do qual já me esqueci.

Por este princípio, o fato de cocriarmos violência em nosso mundo me parece diretamente proporcional às várias violências que fazemos com nossos semelhantes, com a ética, com os princípios de cidadania, e principalmente contra nós mesmos. Se podemos levar vantagem antiética - no trânsito, no imposto de renda, na empresa - porque é que achamos tão ruim quando um assaltante usa também de seus recursos para levar a sua vantagem? Não somos nós os patrocinadores de suas ações? 

Bem-Estar - Qual deve ser o ‘esforço’ ou prática exercitada para obter mais conhecimento e evolução espiritual?  
Freire - Como tentei dar a entender em outras questões, compreendo a espiritualidade como um exercício do cotidiano, exercitado no aqui-agora e não apenas uma série de cultos ou crenças em alguma instância distante. Deus está nos confins do universo infinito, mas é mais próximo buscá-lo dentro de nossos próprios corações, onde Ele também reside.

Vem daí um equívoco comum, o de viver a suposta “espiritualidade” do lado de lá, esquecendo-se da vida aqui. Ora, se viver apenas o consciente e material é a definição de neurose, abrir mão dele para se ancorar só no inconsciente e intangível seria a própria psicose. Espiritualidade, em minha opinião, é um processo de equilíbrio entre essas duas realidades - consciente e inconsciente, objetivo e subjetivo - aplicado ao que vivemos aqui.

Uma boa prática, na minha opinião, é empreender algum caminho de autoconhecimento -psicoterapia séria, meditaçãoreligiosidade sadia - que possa ser convertido em atitudes melhores e mais éticas em nossas esferas de atuação.

Conhecimento é importantíssimo, mas é mais consequência do que substituto. E além do mais, conhecimento não é o mesmo que sabedoria, aquilo que obtemos quando, a partir de nossas escolhas, acumulamos experiência de vida e aliamos a razão ao coração.

Bem-Estar - Entretanto, ao contrário do que você propõe, as técnicas de best-sellers visam mais o futuro. Quais as causas e consequências dessa tendência?

Ótimo ponto. Muitos compram equivocadamente essa idéia - e compram literalmente - de que "O Segredo" para decobrirmos "Quem Somos Nós" é negarmos nosso presente, e a historicidade que nos constituiu. Observe que, na maioria das vezes, o que propõem em seu "método é sempre criar uma ilusão futura distante de sua realidade (estruturas de ansiedade, mania e fantasia), repetir o desejo ao infinito em pensamentos e ritos (característica da obsessão e compulsão), perder o senso de realidade e exequibilidade (ídem, psicose), abandonar a noção de culpa e responsabilidade (psicopatia e sociopatia) - para, a seguir, por cansaço, o antigo crédulo ser confrontado pela realidade, pela própria falta de autoanálise e de atitude ou pelas lei universais de causa-consequência. Então, o antigo "mago" que não se conheceu cai em uma nova e mais intensa depressão, desta vez fabricada, da qual provavelmente só sairá no próximo best-seller, palestra "motivacional", overdose de Prozac ou terapia "alternativa" mágica que encontrar - o que apenas reiniciará todo o processo, em escala maior.

Essa oscilação quase psicótica entre fases maníacas e depressivas tem nome, "transtorno bipolar", e estima-se que já atinja 10% da população ocidental baseada em nosso estilo neurótico de vida. Por isso, costumo dizer que certos discursos motivacionais - filmes, livros, palestrantes, terapeutas "alternativos" - são capazes de fabricar um bipolar em pouquíssimo tempo - e, pior, com o sujeito se sentindo "ótimo". Me parece óbvio, perigoso, e cada vez mais recorrente, financiados pela nossa ansiedade em adquirir logo nossa felicidade fast-food, antes que nosso sonho eterno torne-se obsoleto pelos lançamentos de Desejos 2.0 da próxima estação. Com tanto "mercado consumidor" para a felicidade, eu deveria abrir uma franquia. (risos)

Bem-Estar - Qual a solução, se muitos são infelizes até mesmo quando conseguem realizar seus desejos?

Por trás de cada desejo material, há sempre um meta-objetivo intangível. As pessoas não querem "dinheiro" ou "carro", em último grau elas anseiam "segurança", "liberdade", "amor". Portanto é irônico se tornarem, nessa busca, mais inseguras, escravas da carreira e pouco atentas a seus amores. Outras pediram "casa", mas desejavam ali "família" e "tranquilidade". Infelizmente conheci inúmeros casais que se separaram pouco após conseguirem comprar, mobiliar ou reformar a "casa de seus sonhos". Enfatizo: inúmeros.

Poderia dar outros exemplos, mas sempre há algo intangível e subjetivo atrás de qualquer desejo ou prazer material. Mas vivemos em uma sociedade que cultiva o desejo e estagnação dos meiosobjetivos, ao mesmo tempo em que despreza os fins imateriais. Me parece óbvio que isso gerará problema e frustação, não?
Para o povo grego, aquele que vivia para realizar seus desejos, inclusive materiais, era de natureza concuspicente, e portanto, um escravo. Liberdade era sair de casa, participar da pólis, contemplar o belo, ter olhos para buscar a sabedoria. Animais e escravos é que, limitados aos prazeres sensoriais e necessidade de sobrevivência, viviam para a satisfação dos desejos. Dá o que pensar sobre nossa "liberdade" de "chegar lá" em uma sociedade orientada a consumos e desejos, onde a filosofia, a espiritualidade e o autoconhecimento dão lugares a best-sellers como"O Segredo".
Os gregos tem nisso alguma razão. Animais acordam, comem, bebem, se reproduzem, desejam, marcam território, deitam no espaço mais confortável disponível, depois dormem, repetindo o ciclo até morrer. Não há abstração, não há subjetivo, não há um sentido maior. A maioria das pessoas "de sucesso" que aspiramos vir a ser fazem apenas o mesmo, embora com algum pedigree. Nunca, em toda história da humanidade, precisamos tanto de filosofia e de sentido como nos tempos de hoje; mas ironicamente esta própria ausência faz com que, peixes que não percebem a água do oceano, valorizemos o imediatismo da situação oposta.

Tratei recentemente de uma socialite que havia realizado todos seus desejos, inclusive financeiros e "românticos", mas que para isso sacrificou seus valores, suas origens, e aqueles que mais amou. Hoje vive infeliz e sem sentido, luxuosamente imersa em vazios, fobias e culpas, e chorando ao perceber não conseguir sequer interagir ou merecer o amor e recursos que hoje tem, vindos mais de desejos complexos do que da simplicidade do coração. Um inferno em contos de fadas. Foi um caso clínico didático e desesperador, daqueles que nos deixam com uma pulga na orelha em relação ao que estamos cocriando com nossos desejos e existência.

Bem-Estar - Gostaria de deixar uma palavra final?

Apesar de nossa conversa despretensiosa, o assunto é crítico, e sei da responsabilidade que tenho em matérias assim, que em última análise tocam nos desejos e vida  que cada leitor constituirá. Espero que o compartilhar dessas experiências e reflexões lhes permitam repensar um futuro melhor, ou pelo menos estarem mais atentos ao presente, o que no fim dá na mesma. Se consegui, deixem-me saber.

Desejo sinceramente que os leitores que compreenderam a gravidade do que tentei expressar consigam realizar e cocriar quase tudo o que desejam - para que nunca percam a alegria da conquista, nem a consciência e transcendência de seus limites e menos ainda a valorização do muito que já tem.»





RAIO X:
Lázaro Luiz Trindade Freire, 44 anos, é psicanalista transpessoal e palestrante espiritualista. Licenciando em Filosofia pelo Seminário Paulopolitano (UNIFAI), é colaborador do Instituto de Pesquisas Projeciológicas e Bioenergéticas (IPPB) do professor Wagner Borges, da Revista Cristã de Espiritismo e de diversas publicações e sites espiritualistas. Atende como terapeuta em São Paulo, unindo a espiritualidade, filosofia e psicanálise. Além disso, ministra, a convite, cursos pelo país sobre “Sonhos e Sincronicidades”, “Magia Mental” e outros temas espiritualistas e junguianos. É também o criador da “Voadores”, grupo com sete mil membros, maior lista mundial sobre Universalismo e Espiritualidade no Cotidiano.
Twitter @voadores e @lazarofreire
Fórum lista.voadores.com.br
Cursos e consultas: lazarofreire@voadores.com.br e (11) 9164-9457

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

14th European Conference on Facial Expression

Viva!

A 14ª Conferência Europeia sobre Expressão Facial terá lugar de 16 a 18 de Julho de 2012, no Campus do Instituto Piaget de Almada, em Portugal.

Iniciou-se a recepção de trabalhos na área da expressão facial, emoções, comunicação não-verbal ou relacionados, para apresentação na conferência. Se pretende organizar um simpósio/workshop ou apresentar um poster, envie informação sobre o título, autores e breve resumo (300 palavras) até 5 de Março de 2012.

Os trabalhos aceites serão integrados no livro de resumos que estará disponível na conferência e no site. Todos os resumos/abstracts deverão ser enviados em Inglês.

Ver mais informações no site: http://www.facinlab.com/conference/



quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Livro: Sobre Ética e Psicanálise

«Sobre ética e psicanálise dá sequência à colecção inaugurada com uma obra do economista indiano Amartya Sen, Prêmio Nobel de Economia 1998.

Maria Rita Kehl, psicanalista, doutora em psicanálise e escritora, dirige-se não apenas aos leitores interessados em psicanálise, mas também aos que se preocupam com a crise ética que a sociedade ocidental vem atravessando. A psicanálise não é uma proposta ética, mas um saber de dimensões humanistas que pode contribuir para a construção de uma ética mais adequada às condições das sociedades contemporâneas, ao abordar o sujeito moderno em suas dimensões inseparáveis de conflito e liberdade, de solidão e sociabilidade. Essas dimensões fundamentais do humano estão na base da clínica psicanalítica e orientam o percurso que analista e analisando fazem juntos, em direção à cura do sofrimento psíquico.

O percurso analítico não depende apenas de uma técnica. Tem uma ética própria, que no início deve ser sustentada pelo analista e que ao final de uma análise deve alcançar também o analisando. A responsabilidade pelo desejo inconsciente que age em cada um de nós, o respeito pelas diferenças do outro e a capacidade de enfrentar as dificuldades da vida com um certo senso de humor são alguns exemplos de atitudes éticas que a psicanálise pode nos ajudar a conquistar.»

Ler aqui

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Livro: Fadas no Divã


Fadas no Divã, de Diana Lichtenstein Corso 


«Este livro, envolvente e elucidativo, descreve, explica e relaciona com os conhecimentos psicanalíticos as mais importantes histórias contadas para as crianças, incluindo os contos de fadas clássicos e os personagens atuais, como a Turma da Mônica e Harry Potter. 

Trata-se de uma fonte de reflexão e enriquecimento para pais, professores, psicólogos e demais interessados na infância e no desenvolvimento humano. Constitui, também um valioso instrumento para acesso claro e facilitado aos principais conceitos da Psicanálise. 


Destaque da edição: 
"A visão das Histórias de Fadas, do ponto de vista psicanalítico, abordada neste livro, revela o quanto essas histórias representam estruturas inconscientes inatas no ser humano. 


Escrita com elegância e clareza, de modo atraente mas altamente profissional, a presente obra é um instrumento especial para quem deseja aproximar-se dessa riquíssima realidade, e dessa abordagem eficaz." »



Clique aqui para ler

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Fobias

Para falar de fobias temos de falar de ansiedade, pois os distúrbios fóbicos são uma das perturbações de ansiedade identificadas pelo Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM IV), já a caminho da sua 5ª edição.

A ansiedade, tal como o medo, é uma resposta neurofisiológica ao stress sentido e este, segundo Hans Selye (1978) é a resposta não específica do organismo às exigências a ele impostas. A sua pesquisa pioneira levou ao desenvolvimento do síndroma geral de adaptação, que constitui um conjunto de reacções não específicas desencadeadas quando o organismo é solicitado para se adaptar a um estímulo adverso ou ameaçador. Todos os organismos, desde a bactéria ao Homem, desenvolveram mecanismos de defesa para lidar com mudanças significativas no seu ambiente interno ou externo.

Os estados emocionais, como o são definidos a ansiedade e o medo, modificam e modulam o funcionamento de todas as funções cerebrais e fisiológicas, cuja utilidade é optimizar esta capacidade de adaptação do organismo a um contexto ambiental específico, aumentando as suas hipóteses de sobrevivência, tanto a nível básico (sobrevivência do organismo) como a nível social.

Resumindo, podemos dizer que a ansiedade é um estado de alerta que serve para avisar de um perigo eminente e possibilita a tomada de medidas para enfrentar a ameaça. O medo é um sinal semelhante que se distingue da ansiedade por ser uma resposta a uma ameaça externa conhecida e definida ou de origem não conflituosa. Estes estados emocionais são muito próximos e são regulados pelo Sistema Nervoso Autónomo, que desempenha um papel importante em situações de emergência.

Mas esta resposta "inata" serve para nos deixar em estado de alerta, prontos a reagir, ao nos depararmos, por exemplo, com uma cobra ou mesmo para impulsionar o nosso estudo para um exame, prevenindo uma nota baixa e consequente abalo no nosso ego, muitas também são as vezes em que o perigo não existe e, ainda assim, este sistema é activado como que por engano. No entanto, é mais fácil desencadear todo o processo do que travá-lo, funções estas reguladas por diferentes áreas no nosso cérebro.

A fobia pode então ser definida como um medo irracional e exacerbado, em que este sistema de alarme é disparado por um estímulo mais ou menos específico. Este estímulo pode ser um local, uma situação ou um objecto e pode tomar as mais diversas formas. Podemos encontrar fobias de água (hidrofobia), do ar (aerofobia), de certos animais (como, por exemplo, a aracnofobia ou a felinofobia), da morte (tanatofobia), de espaços fechados (claustrofobia), de sangue (hematofobia), de objectos cortantes, de andar de avião, de atravessar a rua, etc. Cada uma com o seu nome e cada vez se "descobrem" mais nomes para dar a mais fobias específicas. Por uma questão de practicalidade e simplicidade nas nomenclaturas, foram definidos 3 tipos de fobias: fobia específica, fobia social e agorafobia (com ou sem transtorno de pânico associado).

Chegamos no entanto à conclusão que, no fundo, todas se resumem ao mesmo, o medo do medo, pois o que está por detrás do comportamento e mesmo da sintomática é a associação que o sujeito fez a determinado estímulo. E o medo dos próprios sintomas, assim como àquilo a que eles podem levar, levam ao evitamento das situações e objectos-estímulo.

Existem os mais diversos tipos de fobias e a característica que distingue este tipo de distúrbio do transtorno do pânico ou do distúrbio de ansiedade generalizada é o facto de existir um estímulo específico e identificável que dá início à reacção de ansiedade.

De entre estes tipos de fobias, pode ocorrer a Agorafobia ou a Fobia social, cuja característica essencial é uma ansiedade acerca de estar em locais ou situações das quais poderia ser difícil sair ou nas quais pode não haver ajuda disponível na eventualidade de ocorrer, por exemplo, um ataque de pânico ou sintomas associados. Esta ansiedade e medo levam ao evitamento das mais diversas situações.

Sendo que ambas as emoções de que falo são em tudo idênticas, falamos do mesmo tipo de manifestações sintomáticas, que poderão ser somáticas ou cognitivas. De entre estas manifestações podemos referir as tonturas, inquietação, palpitações, taquicardia, formigamentos, tremores, suores excessivos, confusão, sensação de falta de ar, medo de morrer, medo de perder o controlo, desconforto abdominal, náuseas, diarreia, urgência urinária, hiper-reflexia, dores musculares devido à tensão, entre algumas outras variações.

Um facto recorrente em diversas pesquisas é a medida em que a ansiedade afecta as nossas vidas quando o sistema de defesa e alarme é disparado por um estímulo não específico ou que não representa um perigo real, seja para a sobrevivência do organismo ou a nível social.

A ansiedade e o medo são, de facto, estados emocionais que "ocorrem" naturalmente nas nossas vidas. É a partir do momento em que estes começam a ser sentidos de forma persistente e perturbadora, que precisamos de tomar uma atitude. Por vezes pode, inclusivamente, dificultar a ascensão na carreira profissional, quer essa fobia se demonstre nos relacionamentos, ao falar em público ou ante a possibilidade de andar de avião quando este tipo de deslocações se fazem de alguma forma necessárias para tal progressão.

Quando o medo atinge tais proporções na vida de alguém, é necessária ajuda para o vencer e aprender a lidar com a ansiedade.

De entre a oferta terapêutica existente, encontramos a terapia comportamental, a existencial, a Gestalt, a psicanálise, a terapia centrada na pessoa, análise transacional e hipnoterapia. A abordagem terapêutica mais comum na fobia específica será talvez a dessensibilização sistemática e com muito bons resultados. Mas cada pessoa é diferente e assim o seu universo de experiências, como tal deverá ser o seu tratamento.

Podemos encontrar as mais diversas causas na origem destes transtornos fóbicos, assim como diversas teorias explicativas para os transtornos de ansiedade.

De acordo com a teoria psicanalítica, e segundo Freud, existem dois tipos de ansiedade: a ansiedade resultante da libido frustrada e a ansiedade decorrente de um sentimento difuso de preocupação ou medo que se origina num pensamento ou desejo reprimido. Também as teorias cognitivas nos indicam que estes distúrbios surgem de crenças e pensamentos inapropriados e inexactos relativos a circunstâncias do mundo da própria pessoa.

Segundo a teoria comportamental, a ansiedade será uma resposta condicionada a determinados estímulos do meio ambiente do indivíduo.

A teoria existencial tem como ideia principal o facto de que o indivíduo toma consciência de um profundo vazio na sua vida, uma percepção que se pode tornar extremamente perturbadora, sendo a ansiedade a sua resposta a este imenso vazio existencial e de significado.

Nas teorias biológicas, existem estudos genéticos que mostram dados consistentes quanto à existência de pelo menos um componente genético envolvido no processo. Sabemos ainda que o nível de ansiedade do indivíduo se relaciona a um gene específico envolvido na produção da serotonina, que vai no sentido das descobertas que indicam que certas deficiências químicas no cérebro parecem produzir alguns tipos de distúrbio de ansiedade.

Estas descobertas vão ao encontro de outras que nos relatam até o mesmo tipo de fobia em mais do que uma pessoa da mesma família. Podendo estas últimas, no entanto, também estar de acordo com a teoria comportamental justificando este facto como uma fobia que pode ser herdada, não via genética, mas via observação e aprendizagem.

Outros pesquisadores acreditam ainda que a causa pode estar na actividade exacerbada do sistema nervoso autónomo, numa amígdala demasiado activa, área responsável pelo disparo do alarme, ou deficiente activação do córtex pré-frontal, área responsável pela "travagem" do mecanismo.

Concluindo, existem diversas teorias para as causas dos distúrbios de ansiedade, no entanto nenhuma explica integralmente a totalidade dos casos.

O melhor tratamento vai depender então das mais diversas circunstâncias. No que refere à minha prática, a hipnoterapia pode ser de uma ajuda valiosa neste sentido, uma vez que tanto vai abordar a vertente cognitiva, como a comportamental, podendo, se necessário, passar pela análise, pela dessensibilização ou qualquer outra abordagem terapêutica que mais se adeque ao sujeito, tirando partido do estado de atenção concentrada e do relaxamento não só físico, como também do relaxamento das crenças e aprendizagens limitadoras existentes, por assim dizer.


Sofia Morgado
Hipnoterapeuta Referências: American Psychiatric Association (2000). DSM-IV-TR. Retirado de http://virtualpsy.localweb.com.br/dsm.php Selye, H. (1978). The Stress of Life, Revised edition. New York: McGraw-Hill Book Co.

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Artigo: Ansiedade

A ansiedade pode ser sentida nas mais diversas áreas da nossa vida e, no mundo de hoje, é cada vez mais sentida como um problema que é necessário manter sob o nosso controlo, tornando-se este um assunto bastante discutido. Sendo a ansiedade uma vivência universal, partilhada pelos indivíduos que a sentem de uma forma natural na sua vida e por aqueles que a sentem de uma forma patológica, muitos estudos têm sido feitos sobre a emoção em si, as suas causas, os seus efeitos na vida do indivíduo e os seus mecanismos. A ansiedade, definida como um estado emocional, é, tal como o medo, uma resposta neurofisiológica ao stress sentido. Segundo Hans Selye (1978), stress é a resposta não específica do organismo às exigências a ele impostas. No artigo sobre as fobias, abordei, então, um pouco sobre estes estados emocionais muito próximos (a ansiedade e o medo) e sobre a ansiedade enquanto um sinal de alerta, servindo para avisar sobre um perigo iminente e possibilitando a tomada de medidas para enfrentar a ameaça. Estes estados emocionais são regulados pelo Sistema Nervoso Central, mais precisamente pelo sistema Nervoso Autónomo, que desempenha um papel importante em situações de emergência, do qual fazem parte as supra-renais Diversos estudos foram feitos pelas neurociências, que desmontaram e desenvolveram este processo, tendo sido encontrados dois caminhos prováveis para a informação e desencadeamento da respectiva resposta de ansiedade. Inicialmente julgava-se existir apenas um, que levava a informação captada pelos nossos sentidos até ao tálamo, seguindo daí para outras áreas de processamento sensorial no neocórtex, onde esta é processada e compreendida através de outras aprendizagens, enviando finalmente a mensagem à amígdala e ao hipocampo para que a informação fosse comparada com outra já conhecida, sendo desencadeada a resposta a partir deste ponto (Goleman, 2002). LeDoux (1986 cit. por Goleman, 2002) detectou, no entanto, percursos neuronais seguidos pelas emoções que não passam pelo neocórtex, não sendo portanto racionalizadas. Este segundo caminho, chamado de atalho na revista TIME (2002), refere-se a uma menor quantidade de informação que sai do tálamo directamente para a amígdala e o hipocampo, local de “armazenamento-chave da memória” Da amígdala partem mensagens para todas as principais partes do cérebro. Daqui sai informação para o córtex pré-frontal (local que pode bloquear a resposta ansiogénica), assim como, caso a amígdala faça soar o alarme, são activados o hipotálamo, o tronco central e o sistema nervoso autónomo (via medula espinhal). O hipotálamo, responsável por manter a homeostase e regular o comportamento que é crítico para a sobrevivência da espécie, segrega a hormona que prepara o corpo para as respostas de emergência, desencadeando a reacção luta-ou-fuga através de processos secundários. O sistema nervoso autónomo activa a mais diversa gama de respostas no sistema cardiovascular, nos músculos e no estômago. No tronco central, o locus ceruleus produz noreprinefina (também conhecida por “noradrenalina”), espalhando-a pelo cérebro e deixando-o basicamente em estado de alerta. “A maior parte destas mudanças ocorre fora do consciente”, no entanto, “quando a ansiedade que era inconsciente se torna consciente”, a amígdala dispara novamente uma série de respostas já bem conhecidas de toda a sintomática da ansiedade e “toda esta sequência – da incerteza, à surpresa, à apreensão e ao medo – decorre no espaço de cerca de um segundo”. (Goleman, 2002) Um dos inconvenientes deste avançado sistema de alarmes neuronais é o facto de as mensagens urgentes enviadas pela amígdala serem muitas vezes desactualizadas. Enquanto repositório emocional, a amígdala compara a informação que recebe no momento com situações do passado, por associação, e quando um elemento da actual situação é vagamente semelhante a um do passado, considera-o ”igual”, sendo por isso um “circuito tão pouco refinado: age antes de ter plena confirmação dos factos” (Goleman, 2002). A ansiedade deveria ser um mecanismo usado pelo nosso organismo para nos proteger e alertar para o perigo iminente, sempre que activado. Muitas das vezes, é de facto assim que acontece. Tanto serve para nos deixar em estado de alerta, prontos a reagir, ao nos depararmos com uma cobra, como para impulsionar o estudo para um exame, protegendo-nos de uma nota baixa e consequente abalo no nosso ego. No entanto, muitas também são as vezes em que o perigo não existe e, ainda assim, este sistema é activado, como que por engano. Está claro que é mais fácil desencadear todo o processo (via amígdala) do que travá-lo (via córtex pré-frontal). Um factor recorrente nas pesquisas citadas é a medida em que a ansiedade afecta as nossas vidas quando o sistema de defesa e alarme é disparado por um estímulo não específico ou que não representa um perigo real, seja para a sobrevivência do organismo ou a nível social. Mas não só o desencadear do mecanismo em situações não conflituosas, como também a persistência dos sintomas muito além do estímulo ou ameaça ter desaparecido se tornam uma constante nos dias de hoje e uma problemática a resolver. Sofia Morgado Hipnoterapeuta Referências: Golemam, D. (2002). Inteligência Emocional, 11ª edição. Lisboa: Temas e Debates – Actividade Editoriais, Lda. Gorman, C, Park, A., Whitaker, L. & Cray, D. (2002, Agosto 26). The Science of Anxiety. Time Europe, 160, 9, 46-54. Selye, H. (1978). The Stress of Life, Revised edition. New York: McGraw-Hill Book Co

Espelhos do Self - As Imagens Arquetípicas que Moldam a sua Vida

«O que é a sombra? O que é a ´anima´, o ´puer´, a velha, o embusteiro? Como essas figuras intemas - ou arquétipos- moldam a nossa personalidade e determinam nossas escolhas? Essas são algumas das principais questões que este livro se propõe a resolver. Cada um de nós contém um vasto elenco de personagens que moldam nossas percepções e influem em nossas decisões. Baseando-se nas propostas de Jung, esta coletânea analisa quarenta e cinco imagens diferentes de nosso mundo interior e mostra como as mesmas interagem e, assim, apoiam, desafiam, traem ou complementam umas às outras, criando o drama da vida. Alguns desses arquétipos já são bem conhecidos dos leitores de textos de psicologia: a criança interior, a Deusa, o curador, o Self E também são investigadas outras esclarecedoras figuras simbólicas: o órfão, o duplo, a heroína, a vítima, a lésbica, o amigo. O conjunto destes ensaios; penetrantes e perspicazes, escritos pelos psicólogos mais imponantes do momento, mostra ao leitor como: - identificar os arquetipos que estão atuando na sua vida interior; - decidir quais incentivar e quais modificar; - descobfir a aparencia que eles tem nos sonhos; - mostrar como aproveitar seu poder para enriquecer sua vida diária. Tomar consciência dos arquétipos que moldam sua vida favorece o aprofundamento das próprias sensações, a descobena de outras modalidades de percepção, o acesso a recordações já esquecidas e a revitalização dos relacionamentos. Os arquétipos podem servir de guia até para aspectos ocultos da natureza da própria pessoa. Se você aprender a vê-los e a ouvi-los podera libertar-se de seus receios e mobilizar todo um manancial de criatividade.» Descarregar do Mediafire

Livro: Consciência do SER

Um livro de reflexões sobre temas diversos do mundo físico-espiritual, como consciência, acção e reacção, mestres, o amor ou o bem e o mal. Temas estes que foram sendo pensados e traduzidos em palavras por mim ao longo de alguns anos.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Livro: A Linguagem dos Deuses - Antonio Carlos Farjani

Que são os mitos? Um compêndio das crenças supersticiosas dos povos antigos? A manifestação de desejos neuróticos ou fantasias infantis reprimidas, como queria Freud? A expressão simbólica de dramas interiores inconscientes que revelam a natureza da psique, como preferia Jung?

O autor vai mais longe. Em vez de dramas psicológicos, apresenta os mitos como dramas cósmicos; ao invés de histórias humanas, histórias divinas. Não como produto de experiências acumuladas, mas como estruturas pré-existentes ao próprio homem. Os mitos não estão a serviço de quaisquer desejos, ao contrário, são a expressão de leis Universais que regem o Todo: das galáxias ao mundo subatômico, do mundo material ao espiritual, do espaço sideral ao interior da alma humana.

Contudo, para podermos compreender os mitos, aqui apresentados como verdadeiros roteiros de iniciação, precisamos esquecer nossa línguagem cotidiana, penetrando a línguagem dos Mistérios. É esta, portanto, a proposta de Linguagem dos Deuses: aproximar-nos da linguagem não-humana que subjaz nos mitos e lendas trazendo à luz um pouco de seu esquecido esplendor.

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terça-feira, 7 de junho de 2011

Bipolar: Memórias de Extremos

Num momento, Terri Cheney está agachada sob sua mesa em seu escritório em Beverly Hills, paralisada pela depressão no momento seguinte, empinando pipas à beira de um penhasco sob uma violenta tempestade. Num outro momento, ela está tomando uma dose excessiva de analgésicos com tequila e depois está perdidamente apaixonada. Bonita, extremamente bem-sucedida e brilhante, Cheney como outros 10 milhões de pessoas, apenas nos Estados Unidos sofre de transtorno bipolar, um terrível segredo que quase a matou. A autora revela os efeitos causados por essa devastadora doença sobre si e sobre aqueles que a cercavam. Desde as múltiplas tentativas de suicídio, experiências de quase morte, noites na cadeia e exploração sexual, passando por amizades rompidas e pelo tratamento de eletrochoque, Bipolar é o retrato de uma vida vivida em extremos, uma inesquecível viagem numa montanha-russa.

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segunda-feira, 6 de junho de 2011

Psiquiatria Junguiana

A experiência do autor como terapeuta e supervisor fazem deste livro uma preciosidade, pois restitui à psicopatologia seu lugar no contexto geral e no processo de individulização. Aqui são apresentadas observações psiquiátrico-analíticas repletas de preciosas intuições de um junguiano respeitado e raro terapeuta, que assim como Jung, trabalhou em psiquiatria.

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Workshop: Emotion Focused Therapy

Local: Lisboa
Data: 25 a 26 Junho 2011

A Sociedade Portuguesa de Psicoterapias Construtivistas organiza, no contexto da 6ª Especialização em Psicoterapia, workshop de 2 dias em Terapia Focada nas Emoções, com o Prof Leslie Greenberg, da Universidade de York, em Toronto.

Apresentação

A PE-EFT é um modelo terapêutico neo-humanista e pluralista com amplo suporte empírico. Baseia-se na Teoria das Emoções contemporânea e integra elementos de diferentes abordagens psicoterapêuticas - centrada-no-cliente, gestalt, existencialista – em torno de um conjunto de tarefas terapêuticas.

Este workshop certificará o primeiro nível de treino em EFT.

The focus of the program will be experiential, learning how to produce change in core emotional structures. Many approaches to date have focused on changing cognition or conscious understanding. EFT focuses on changing emotion and using adaptive emotion as a guide to living. The programme will provide hands-on skills development.

Secretariado

Informações e Inscrições para construtivistas@sppc.org.pt e através da homepage: www.sppc.org.pt

Tel: 213851327 | 965522423 | Sede | R. Ramalho Ortigão, 39 1º esq. 1070-228 Lisboa

Podem candidatar-se psicólogos - licenciados/ mestres com 300ECTS/ 5anos - médicos e estudantes finalistas (240 ECT) de ambas as licenciaturas - exigível conclusão de mestrado integrado.

Enviar CV e certificado de licenciatura para construtivistas@sppc.org.pt ou pelos correios para R. Ramalho Ortigão, 39, 1º Esq. 1070-228 Lisboa. Pode também contactar-nos na área de inscrições no menu principal.

Não Associados: De 1 Abril a 31 Maio 180€ | A partir 1 Junho 220€
Associados SPPC:De 01 Abril a 31 Maio 160€ | A partir 01 Junho 200€
Estudantes:De 01 Abril a 31 Maio 140€ | A partir 01 Junho 180€

II Jornadas de Alcoologia / I Encontro de Tabacologia

Nos próximos dias 16 e 17 de Junho, no Hotel do Mar, em Sesimbra Organização do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa.

Descarregar folheto de informação e inscrição aqui

IV Jornadas de Psicologia

Nos próximos dias 7 e 8 de Junho, no Campus de Viseu do Instituto Piaget. Ver mais informações aqui.

Descarregar programa aqui

As Opiniões e as Crenças

Gustave Le Bon foi o fundador da Psicologia Social. Em As Opiniões e as Crenças, Le Bon apresenta de forma brilhante as várias formas de lógica: biológica, afetiva, coletiva, mística e racional. A partir daí, passa a analisar as opiniões e as crenças, sua gênese, desenvolvimento, transformação, propagação. Embora tenha sido escrita há muitos anos, é uma obra extremamente atual. Le Bon explica ainda o papel do prazer e da dor, para então avaliar as características do consciente e inconsciente.

Download do livro: Clique aqui!

A idéia da fenomenologia

Contrariamente a todas as tendências no mundo intelectual de sua época, Husserl quis que a filosofia tivesse as bases e condições de uma ciência rigorosa. Porém, como dar rigor ao raciocínio filosófico em relação a coisas tão cambiantes e variáveis como as coisas do mundo real? O êxito do método científico está em que ele pode estabelecer uma "verdade provisória" útil, que será verdade até que um fato novo mostre uma outra realidade. Para evitar que a verdade filosófica também fosse provisória, a solução, para Husserl, é que ela deveria referir-se às coisas como se apresentam na experiência de consciência, estudadas em suas essências, em seus verdadeiros significados, de um modo livre de teorias e pressuposições, despidas de seus acidentes próprios do mundo real, do mundo empírico objeto da ciência. Buscando restaurar a "lógica pura" e dar rigor à filosofia, argumenta a respeito do principio da contradição na Lógica.

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